Exames Laboratoriais na Cólica Equina

A Cólica Equina, considerada uma síndrome multifatorial, é um processo patológico doloroso de início repentino, que possui repercussão sistêmica e requer um rápido diagnóstico e tratamento, se encaixando dessa forma na classificação geral de abdômen agudo. Tem origem no trato gastrointestinal, porém, lesões em outros órgãos abdominais como fígado, baço, rins, vesícula urinária e útero, e peritôneo também podem causar dor / desconforto abdominal. Vários são os comportamentos visíveis em equinos com dor abdominal, porém, alguns animais, manifestam apenas inapetência e apetite caprichoso.

Alterações na frequência cardíaca são normalmente observadas e são decorrentes da dor e de alterações cardiovasculares devido à hipovolemia e toxemia. Já a frequência respiratória pode estar aumentada devido à excitação, dor, choque, compensação do equilíbrio ácido-base (acidose metabólica), distensão do estômago, ceco ou cólon. A redução no valor dessa variável pode ocorrer nos casos de extrema depressão do sistema nervoso central devido à toxemia, além de situações de alcalose devido à perda de cloretos no refluxo gástrico.O sequestro de líquidos para o lúmen intestinal, agravado por problemas cardiovasculares decorrentes da insuficiência circulatória periférica, assim como pelo refluxo causam sintomas como a desidratação.

Para auxiliar o clínico no diagnóstico e sua gravidade, e também na avaliação do prognóstico, alguns exames laboratoriais são indicados. Vamos discutir alguns deles:

HEMOGRAMA:
Os valores do Eritrograma (número de hemácias, hemoglobina e hematócrito / volume globular) geralmente encontram-se elevados. Isso deve-se à hemoconcentração (desidratação e choque) e à contração esplênica. Já o inverso pode ser visualizado em quadros com hemorragias, úlceras, hemoperitôneo ou enfermidade inflamatória crônica.

O aumento da Leucometria total, do número de neutrófilos (bastões e segmentados) e monócitos juntamente com a diminuição no número de linfócitos, eosinófilos e basófilos foram compatíveis com a resposta leucocitária aos agentes pró inflamatórios liberados na endotoxemia geralmente presente. O aumento nos níveis de endotoxinas é tido como causa de leucopenia, mas esse efeito só é observado nas primeiras duas horas. Caso já tenha se passado mais tempo do início do acometimento patológico, a presença de leucopenia é um sinal de mau prognóstico, podendo inclusive indicar ruptura intestinal.

A diminuição da quantidade de plaquetas podem sugerir a presença de Coagulação intravascular disseminada (CID). Para confirmar esse quadro, as dosagens de Tempo de Protrombina (TP) e Tromboplastina Parcial Ativada (TTPA) e seus respectivos aumentos são necessários.

PROTEÍNAS PLASMÁTICAS TOTAIS (PPT):
Assim como o Eritrograma, o aumento das PPT também se deve à desidratação e contração esplênica. Já a hipoproteinemia pode ser secundária à perda intestinal, como na ulceração crônica, intussuscepção, neoplasia e doença intestinal inflamatória.

FIBRINOGÊNIO: A análise seriada do fibrinogênio contribui de forma positiva e precoce no diagnóstico de processos inflamatórios e infecciosos em equinos com cólica.

DOSAGENS BIOQUÍMICAS:
Lactato: sua concentração vem sendo utilizadas como marcador de perfusão periférica, uma vez que altos índices ocorrem secundariamente a hipóxia tecidual. Inúmeros fatores podem estar envolvidos na interrupção da oxigenação tecidual, porém a causa mais comum em equinos é a hipovolemia.

Creatinina: o aumento na concentração de creatinina sérica (>2 mg/dL) é indicativa de prejuízo renal. A elevação desse biomarcador da função renal na corrente sanguínea pode estar relacionada tanto com a hipotensão, como também com a septicemia, trombose, isquemia e com a coagulação intravascular disseminada (CID).

Glicemia: a hiperglicemia persistente é um indicador de prognóstico reservado a mau. Ela ocorre provavelmente à resistência insulínica devido a síndrome metabólica intensa. Provável sepse, doença severa ou estrangulamento intestinal.

AST / ALT / Fosfatase Alcalina / GGT: estarão elevadas na presença de hepatopatia.

Cloro / Sódio: diminuídos no caso de colites.

ANÁLISE DA EFUSÃO PERITONEAL (ABDOMINOCENTESE / PARACENTESE)
Um dos exames laboratoriais que mais auxilia no diagnóstico, direcionando a terapia e determinando a gravidade da lesão abdominal é a análise do líquido peritoneal, uma vez que a peritonite, independente da causa, provoca sensíveis alterações. 

O peritônio inflamado apresenta a permeabilidade aumentada, resultando em aumento de volume e da concentração de proteínas no líquido peritoneal. Além disso, há migração de leucócitos pela liberação de substâncias quimiotáxicas e aumento do número de hemácias em lesões mais graves. 

Essas alterações, qualitativas e quantitativas, ocorrem após 12 horas da instalação da peritonite. Várias alterações citológicas visualizadas durante a análise podem auxiliar o clínico, como indicar uma provável neoplasia primária, severidade do quadro, parasitismo, cronicidade, entre outros. 

Algumas alterações físicas, como a coloração da efusão, podem sugerir dados a mais. Porém, só são confirmadas com a análise completa da efusão e sua clasificação. Confira alguns exemplos:

  • Cor amarelo muito claro: indica a possibilidade de ascite ou uroperitônio.
  • Cor serossanguinolenta: sugere degeneração intestinal, perda transmural de hemácias, nas lacerações de vísceras abdominais ou quando há contaminação do líquido com sangue oriundo de vasos de pele ou da musculatura.
  • Cor âmbar e ligeiramente turvo: sugere aporto sanguíneo insuficiente ao intestino, associado à diapedese de glóbulos vermelhos e brancos dos capilares da serosa.
  • Cor escura sanguinolenta e não coagular: sugere necrose intestinal.
  • Cor amarronzada: sugere necrose tecidual avançada.
  • Cor amarelo acastanhado opaco com elevado número de leucócitos: sugere peritonite. Porém, nos exsudatos opacos pode haver coagulação se a peritonite associada for demasiadamente severa permitindo a passagem de fibrinogênio para o fluído peritoneal. Os sinais clínicos podem ser consistentes à instalação de choque.
  • Cor verde acastanhado opaco: sugere a presença de conteúdo intestinal livre, ocasionado por enterocentese ou de uma ruptura intestinal. Há presença de partículas alimentares, bactérias e protozoários, visualizadas durante a análise da efusão.

Várias dosagens também podem ser solicitadas utilizando a efusão. Lactato, proteínas e glicose estão aumentados durante a cólica. O primeiro sinal de anormalidade bioquímica na efusão é o aumento da proteína, juntamente com a concentração de fibrinogênio superior a 100mg/dL, indicando processo inflamatório agudo. O fósforo é aumentado nos casos de isquemia intestinal, e está relacionado com a gravidade das lesões, de modo que concentrações acima de 11,5 mg/dL (3,6mmol/L) podem sugerir a necessidade de ressecção intestinal ou eutanásia. O aumento do lactato ocorre em casos de isquemia mais intensa.

Além disso, a Cultura Bacteriana / Antibiograma da efusão também pode auxiliar o clínico na escolha de um tratamento antimicrobiano mais adequado.

Por se tratar de uma alteração de caráter emergencial, quando solicitado pelo veterinário dentro do horário de funcionamento do Laboratório, direcionamos esses exames para a rotina de Urgência, liberando esses resultados o mais rápido possível.

Exames citadosMaterial
Hemograma + PPTSangue Total (EDTA)
FibrinogênioSangue Total (EDTA) ou efusão
Proteínas TotaisPlasma (EDTA) ou Soro ou efusão
Creatinina

Soro ou Plasma (EDTA)

ALT / ASTSoro ou Plasma (EDTA)
GGT / Fosf. AlcalinaSoro
LactatoSoro ou efusão
GlicoseSoro ou Plasma (EDTA ou Fluoreto)
FósforoSoro ou efusão
SódioSoro
CloretoSoro
TP / TTPAPlasma (CITRATO DE SÓDIO)
Análise de Efusão PeritonealEfusão peritoneal (2 tubos – com e sem EDTA)

 

 

Referências Bibliográficas:

DI FILIPPO, P. A; SANTANA, A. E. Variações nas concentrações dos biomarcadores sanguíneos da função renal e hepática em equinos com cólica. Veterinária Notícias, v. 13, n. 2, 2007.

BROWN, C. M.; BERTONE j. Consulta veterinária em 5 minutos. Barueri, SP: Manole, 2005.

ABUTARBUSH, S. M.; CARMALT, J. L.; SHOEMAKER, R. W. Causes of gastrointestinal colic in western Canada: 604 cases (1992 to 2002), Canadian Veterinary Journal, v. 46, n. 9, 2005.

MOORE R.M (2006). Diagnostic approach to colic in horses [versao electronica]. In Proceedings of the 2006 North American Veterinary Conference. http://www.ivis.org

FERNANDES, Carina Simões. – FACTORES DE PROGNÓSTICO DA CÓLICA EM EQUINOS. Universidade técnica de Lisboa. Faculdade de medicina veterinária. Dissertação de Mestrado Integrado Em Medicina Veterinária. Lisboa. 2009.

CAMPELO, Jairo; PICCININ, Adriana – Cólica Equina. REVISTA CIENTÍFICA ELETÔNICA DE MEDICINA VETERINÁRIA – ISSN: 1679-7353. Ano VI – Número 10 – Janeiro de 2008 – Periódicos Semestral. Disponível em: http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/K2zHbx7QrPNAPld_201 3-5-29-10-40-19.pdf.

DI FILIPPO, P.A., A.E. Santana, A.F.S. Nogueira, L.A. Anai, E. Campos Filho – Características celulares e bioquímicas do líquido peritoneal de equinos submetidos à obstrução experimental do duodeno, íleo e cólon maior. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec. v.61, n.6, 2009. Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – UNESP.

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